quarta-feira, 18 de setembro de 2013

O CARA DA IMPRENSA




O cara detestava a felicidade alheia. Felicidade não vendia jornal nem dava uma boa capa de revista. Quando recebia convites para ir a casamentos de celebridades fazia uma prece silenciosa: "Tomara que role uma traição". Não é que não gostasse de casamentos, eles impulsionavam as revistas de fofocas, mas o que vendia mesmo eram os divórcios. O povo queria saber o motivo, se tinha outra ou outro na história, o valor da indenização!

Se a Xuxa casasse de novo ia vender uma penca de revistas, mas imagine se ela divorciasse e o motivo fosse cabeludo? Já imaginou a matéria? "RAINHA DOS BAIXINHOS TRAÍDA COM MULHER FRUTA DO CONDE!" Venderia mais que a Playboy da Melancia!

E por força do ofício de garimpar notícias ruins, Adalberto começou a se tornar uma pessoa ruim. Quando a notícia não acontecia ele a criava! Com seu talento fora do normal escrevia sobre tudo, de economia à sétima arte. "Se a Míriam Leitão pode porque eu não posso?" Disparava a quem o questionasse. Então se a seleção jogasse abaixo do esperado ele rapidamente escrevia uma nota em sua coluna: "SELEÇÃO BRASILEIRA ENTRA EM CRISE", caso um artista fosse até um hospital retirar sangue para exames de rotina lá vinha ele com uma das suas: "DOENÇA MISTERIOSA PREOCUPA ASTRO SERTANEJO". 

Antes de dormir ele já agourava todos que conhecia. Sonhava com desastres aéreos, acidentes de trânsito, quebras da bolsa e coisas do tipo. Mas o que ele mais desejava era um furo, a notícia em primeira mão que ele teria o prazer de lançar com exclusividade. Nada de falar de mais um casamento da Suzana Vieira ou de mais um desvio de verba, coisas que se vê todo dia. Ele queria entrar para a história de imprensa brasileira de forma marcante.

E numa noite como em outra qualquer teve a grande ideia: Ia cometer suicídio! A morte de um cara da imprensa sempre repercurte, então a dele deveria ser original! Redigiu uma carta comovente e deixou em local de fácil acesso. Foi até o computador e acessou o facebook para avisar ao mundo que em protesto em favor da eutanásia tiraria a própria vida.

Ele pouco ligava para doentes terminais. Até aquele dia tinha raiva dos médicos que salvavam vítimas de câncer e o privavam de editoriais fúnebres, mas tinha que dizer algo para deixar a vida e entrar para a história! Como não queria sentir dores pegou um revólver e deu um tiro no ouvido.

Assim que chegou ao inferno foi recebido pelo diabo em pessoa:
_ Tão cedo, Adalberto?

_ Queria entrar para a história. Agora devem estar fazendo uma cobertura sobre minha morte. Coloquei a nota no face e dei um tiro no ouvido. Já está repercutindo?

_ Não. Você morava em Recife e se matou no meio de um apagão elétrico!

_ Porra! Mas vão dar por minha falta.

_ De jeito nenhum. Aquele fio desencapado de extensão onde você liga todos os aparelhos da sala vai entrar em curto quando a energia voltar e vai queimar o carpete e causar um incêndio. Adeus carta, apartamento e seu corpo.

_ Mas que merda! Mas o incêndio do meu prédio será comentado e alguém vai dar por minha falta.

_ Que nada! Neymar vai marcar pela seleção na mesma semana. O big brother vai voltar e aquele ator vai resolver sair do armário. Uma l-o-u-c-u-r-a!

- MAS QUE IMPRENSA ALIENADA E MALDITA! BANDO DE PARASITAS ORDINÁRIOS QUE VIVEM APENAS PARA DIFAMAR E ACABAR COM REPUTAÇÕES! NÃO DÃO VALOR A NADA! MERECIAM IR TODOS PARA O INFERNO! Gritou Adalberto transtornado.

_ É verdade, disse o diabo. É verdade!

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